segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Lembranças 8

Estamos há poucos meses da eleição do novo Prefeito e dos Vereadores da Câmara Municipal. A agitação política começa. Só que desta vez não foi tão tranqüila como a primeira. Alfredo Manoel Francisco era funcionário do Posto de Saúde na função de atendente. Tinha muito prestigio e foi designado por Moacir como candidato a Sucessão.
Remédios na época eram escassos. Existiam somente vacinas e analgésicos. O médico atendia somente uma vez por semana, aos sábados. Mas mesmo pela pequena quantidade de remédios, pois o Município tinha uma arrecadação de recursos financeiros irrisória, todos eram por ele distribuídos. Isso lhe dava um contato permanente com a população, mesmo sendo considerado um “estrangeiro”, pois era natural de Jacareí, onde sua família residia.
Alfredo era esperto. Tinha pouca instrução, talvez o 4.º ano do Grupo Escolar. Era muito arrogante,mas de certa forma bem eloqüente.Lançado candidato, criou um mal estar entre os companheiros de Moacir, que inclusive tinham lutado bravamente pela emancipação do município. Nage, Machado, João Caipira, Don e outros mais, não gostando e nem apoiando essa indicação, pois nem si quer foram consultados, se desligaram do partido, rompendo inclusive a amizade. Até aquela data era um grupo homogêneo.
No PSP nada havia mudado. Continuava sob o comando do Nhô Nito Vaz, ademarista roxo. É lançada então a candidatura de Mário Rozendo da Silva mais conhecido como Mário Dentista.
Filho de Igaratá, apesar de residir em Santa Isabel, gozava também de bom conceito junto a população.Era protético e atendia a população de Igaratá aos sábados. Além da confecção de próteses dentárias, executava alguns serviços como, extrações e obturações de pequeno porte.
Lembro-me bem. Obturar um dente naquela época era um flagelo. Não pela capacidade profissional, mas sim pelas condições precárias. Lembrem-se bem. Energia Elétrica só das 19 às 21 horas. O aparelho utilizado na época se constituía de um tripé. Na parte de baixo tinha uma roda, no mesmo sistema das máquinas de costuras, acionada através de um pedal. Essa roda acionava uma correia que por sua vez fazia girar uma cabo de aço flexível onde na sua extremidade se encontrava o maior instrumento de tortura da época. A famigerada “BROCA”. Esta é que ia perfurar e limpar o dente a ser obturado. Me dá até calafrios em lembrar, pois passei por essa “tortura” como tantos outros. De toda a forma valia a pena passar por esse sacrifício, pois os serviços de próteses, principalmente as dentaduras eram a sua especialidade.
Aí está mais ou menos definido o perfil dos dois candidatos.
Os antigos companheiros de Moacir passaram a prestigiar e apoiar a candidatura do Mário Dentista. O tempo começava a esquentar e as panelas a ferver!
A Justiça Eleitoral autoriza a instalação de dois serviços de alto-falantes.
O PSD que apóia a candidatura do Alfredo, instala no armazém do Zé Madeu.
O PSP que apóia o Mário Dentista, instala num casarão que se encontrava desocupado na entrada da “Vila”, onde posteriormente funcionaria o bar do Massami Oka e posteriormente do João do Bar. Como a energia elétrica boa so funcionava das l9 às 21 horas, foi estabelecido o ,seguinte: Uma semana o serviço de alto-falante do PSD funcionaria das 19 às 20 horas e o do PSP das 20 às 21 horas, alternando-se os horários na semana seguinte.
Lamentavelmente, o que se transmitia era pura baixaria. Ambos os lados se esqueciam o fator político, o que poderiam fazer em benefício da população. Só se preocupavam em ferir, denegrir e desgraçar o moral do adversário e dos seus correligionários.
Hoje muita pouca coisa mudou. Os insultos ainda persistem mesmo com as penalidades impostas pela Justiça Eleitoral.
Pois é meus amigos! Política é uma ciência! Para ser político dos bons é necessário entender muito bem da arte. Frases como já ganhei; essa já está no papo, são muito prejudiciais e catastróficas.
Alfredo, talvez com conhecimento mais profundo sobre o assunto, resolve transferir sua residência para Igaratá, com toda família. Isso lhe dava todo o tempo necessário para estar junto da população, freqüentando bares, festinhas na roça e aí, promessas e mais promessas. Constantemente freqüentava o Cartório Eleitoral, onde eram feitas as transferências , emissão de títulos, possíveis embargos, etc.
Mário já pensava diferente. Acreditava que como filho da terra e com o prestígio que gozava como dentista, não havia mais nada há fazer. A eleição estava ganha!
Enquanto isso, Alfredo não parava.
De tanta insistência de seus cabos eleitorais e dos candidatos à vereança pela sua chapa, Mário resolve fazer um grande comício. Aproveitou que a data coincidia com uma festa religiosa, se não me falha a memória, em louvor a São Benedito.
No pátio da igreja havia grande aglomeração. O palco já estava montado. Espiões do candidato adversário, tentavam assistir o comício escondidos atrás e ao lado da igreja, pois assistir junto a população era vergonhoso, podendo ocorrer desafetos entre as partes, chegando as vias de fato. As ruas estavam praticamente lotadas, pois a população da zona rural, na época era maioria absoluta, compareceu em peso.
No palanque, candidatos discursavam, um após outro, sem interrupção. Fogos de artifício espocavam no ar. De repente, chega uma notícia estarrecedora!
A patrol do DER – Departamento de Estradas de Rodagem, cedida pelo governo do Estado para prestar serviços nas estradas municipais, havia atropelado e matado uma criança de mais ou menos 7 anos de idade. Ao lado do patroleiro, encontrava-se o candidato Alfredo, que voltava dos bairros da zona rural. Eram aproximadamente 17 horas. Alfredo tinha aproveitado para fazer campanha nos bairros. Era importante sair com a máquina, principalmente para melhorar o leito das estradas.
O que era festa e comício, terminou em tragédia e balburdia.
Começa então o disque disque, empurrões e xingamentos. De um lado, correligionários defendiam o Alfredo. Do outro, instigavam a população para pegar o Alfredo, culpando-o pelo acidente. Onde já se viu? Uma máquina daquele tamanho passar na rua em dia de festa com tanta gente? Isso é provocação! Chegaram a dizer que o Alfredo era quem estava dirigindo. Alfredo teve que se esconder na casa do Sr. Jose Alves de Almeida, que era vereador e morava bem em frente ao local do acidente, só podendo sair às altas horas da noite, quando já não existia praticamente ninguém na rua. Sem iluminação, depois das 21 horas, o negócio era todo mundo se recolher.
Após essa tragédia, a bandeira do “já ganhou” foi içada às alturas pelos cabos eleitorais do Mário Dentista. Acreditavam que Alfredo tinha sido derrotado mesmo antes da eleição. (continua na Lembranças 9).

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