terça-feira, 27 de outubro de 2009

Lembranças 10

PROFECIA OU COINCIDÊNCIA ?


Consta que há muitos e muitos anos, não se tem data precisa desse possível acontecimento, que na Velha Cidade de Igaratá, existiu um padre com sotaque estrangeiro, já com idade avançada, que era antipático, nervoso e muito severo.

A maioria dos católicos se sentia humilhada e constrangida com os maus tratos a que eram submetidas pelo pároco. A maioria da população que vinha de longe para participar das festas religiosas, nas quais era distribuído o tradicional café com biscoito para a população carente que chegava da zona rural, distante às vezes até 25 quilômetros da “Vila”, já havia sido suspensa por proibição do rancoroso pároco.

Estava se tornando cada vez mais difícil, no encerramento da festa, a nomeação de festeiros, que seriam dois casais, para o próxima ano. Era costume os festeiros, nomearem os seus sucessores com a aprovação do padre.

As exigências do padre estavam dificultando a aceitação de novos substitutos, que sempre arrumavam uma desculpa para se safarem dessa incumbência. A solução mais viável para o caso seria a substituição do vigário por outro que fosse mais dócil e compreensivo. Tentaram de tudo junto a Diocese para a sua substituição. Tudo em vão, nada conseguiram. Tinham que se sujeitar a severidade do sacerdote, que de forma alguma mudava o seu comportamento perante a população.

Para ficarem livres dos problemas, só havia uma saída: expulsar o padre da cidade!

Parte dos católicos não se sentia bem com a atitude que estava sendo tramada. Tinham medo de serem punidos por algum Santo ou talvez pelo Criador. Comentavam: onde já se viu expulsar o padre da cidade? Os demais pouco se importavam. O negócio era ficar livres dos maus tratos que até então eram submetidos. A Igreja estava cada vez mais vazia.

Num certo dia aconteceu! O padre foi escorraçado da cidade. Uns tremiam de medo, outros davam risada. O medo foi maior ainda quando, há uns quinhentos metros da “Vila” perto da Rua da Palha o vigário ajoelhou e esbravejando, como diz a crença, “rogou praga”, profetizando o seguinte: “ Que a cidade jamais iria crescer e progredir”e que um dia seria derrubada e desapareceria da face da Terra.

Alguns católicos tremiam de medo. Outros, dando risada diziam: “Coitado, além de velho já está caducando”. Vê lá se praga existe!

Bem, se praga existe e pega ou se foi coincidência eu não sei. O que eu sei é que nos vinte anos que vivi na “Velha Igaratá”, nada mudara. Parecia que vivia parada no tempo e no espaço. Mas o pior ainda iria acontecer.

No ano de 1968, justamente na época em que eu estava cumprindo o mandato de Vereador, gratuitamente, o Prefeito José Afonso Barbosa é notificado que estava sendo construída a Barragem do Jaguari e em conseqüência, grande parte do município e a “Vila” ficariam submersos. Todos seriam desapropriados e indenizados.

A população jamais acreditava. Dizia que não passava de mero boato. Que altura teria essa barragem para poder inundar a “Vila” com as águas do Rio Jaguari? Bobagem, isso nunca vai acontecer!

Infelizmente a população estava enganada.

Foi marcada a data de 5 de dezembro de 1969. Seria o último dia da existência da Velha Igaratá. Todos deveriam ter se mudado. Guindaste, com uma grande bola de ferro pendurada em uma corrente, terminava com a destruição das casas, ou melhor dizendo, dos casarões de taipa que foram construídos no século 19. O último prédio a ser derrubado foi a Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio.

Muita tristeza, muito choro da população, principalmente dos idosos. As lágrimas roladas contribuíram para engrossar as águas do Rio Jaguari. Eu que havia chegado em Igaratá em 1949, também não suportei. Foram vinte anos da minha vida. Infância e juventude, tudo estava chegando ao fim. Só restariam as lembranças! As doces lembranças e nada mais.

Hoje a Velha Igaratá, mais carinhosamente chamada de “Vila” repousa nas profundezas da Represa do Jaguari!

Pois é, meus amigos, se foi profecia ou coincidência deixo para vocês julgarem. O que posso afirmar é que a Velha Igaratá nunca prosperou, foi destruída de acordo com a “praga” lançada pelo vigário, conforme diz a lenda.

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