Durante a minha juventude, lá pelos anos 60, na Velha Igaratá, pouco se tinha o que fazer.
Nadar, pescar, jogar bola, snooker, e de vez em quando, um bailinho à luz de lampião, eram os únicos entretenimentos.
Para matar o tempo, formamos um conjunto com as seguintes pessoas: João do Orioste no cavaquinho, Abrãozinho no pandeiro, Zé Camargo no surdo e eu no violão.
Principalmente nas noites de lua cheia, lá íamos nós de porta em porta fazendo àquela gostosa serenata. As músicas prediletas eram as do Nelson Gonçalves como; A volta do Boêmio, Deusa do Asfalto, Renúncia por mim cantadas e outras de autoria de Waldir Azevedo e Jacó do Bandolim, soladas no cavaquinho do João do Orioste, sendo as mais solicitadas, Brasileirinho, Carinhoso, Doce de Coco, Pedacinho do Céu e muitas outras mais.
Geralmente, no encerramento, cantávamos a valsa Saudades de Igaratá de autoria da poetisa Petronilha de Souza, genitora do cartunista Mauricio de Souza.
Lá pelas vinte horas, íamos nós com destino ao sítio do Donzinho, distante uns três quilômetros da Velha Igaratá, carinhosamente chamada de “Vila”, bem a beira da Estrada do Rio do Peixe. Don também era amante da música romântica. Tinha um acordeom de oito baixos e sempre nos recebia com muita satisfação. Ficávamos mais ou menos até às vinte e duas horas.
Don jamais deixava sairmos sem primeiro oferecer um suculento café acompanhado de fartas guloseimas preparadas pela sua esposa Dª Giselda.
Essa era a hora que, aproveitando da nossa ausência da sala de visita, derrubava um pouco de rapé em cima dos instrumentos. Dá para perceber o que acontecia no nosso retorno. Ao dedilharmos o cavaquinho, o violão, as pancadas no pandeiro e no surdo, o rapé se espalhava pelo ar. Eram espirros para todos os lados. Ninguém sabia o que estava acontecendo. Só depois de muito tempo é que fomos descobrir.
Na volta para a “Vila”, a nossa primeira parada obrigatória era a chácara do Professor Jaime dos Santos, marido de Dª Cinira e genitor da Nanci mais conhecida na época como Dona Nanci do Cartório. Seu Jaime, professor aposentado, também era músico. Tocava um dos mais belos instrumentos musicais. O violino!
Aí ficávamos até às vinte e três horas. Éramos também muito bem recebidos pelo casal, sem, esquecer da Nanci com aquela simpatia que muito lhe é peculiar. Da chácara do Sr. Jaime até a “Vila” a distancia não passava de um quilômetro. Nesse ínterim, parávamos com a nossa seresta, já que não havia nenhuma casa nesse trecho. Precisávamos também tomar um fôlego, já que haviam mais duas paradas obrigatórias. A primeira, pertinho do Ribeirão das Palmeiras, há cem metros do centro da “Vila”. A casa do Zé Igaratá. Chegávamos bem na surdina para não despertar a família, pois o importante de uma serenata é a surpresa. É ser acordado com o som de música romântica e sentimental.
Após tocarmos uma ou duas músicas, pois geralmente de dentro da casa sempre era solicitado “mais uma”, era o que fazia nos sentirmos realizados. Zé Igaratá não deixava por menos: Deus lhes pague! Muito obrigado!
Assim continuávamos a nossa peregrinação até a janela da casa do Zezinho Vaz, já bem no centro da rua principal.
É normal, com a mudança da temperatura, as cordas do cavaquinho e do violão desafinarem. As vezes isso acontecia, e por nossa infelicidade, bem de baixo da janela da casa do Zezinho Vaz! Este não perdoava; antes de começarmos a seresta ele já gritava: Vão afinar os instrumentos lá na p. q. p. Vocês já devem ter interpretado o teor na frase.
Como já estávamos acostumado com essa reação, não ligávamos e duas ou três músicas eram por mim cantadas e soladas pelo cavaquinho do João do Orioste. No final acontecia o de sempre: Muito obrigado!
Com essa apresentação, terminávamos com a nossa serenata, pois já passava da meia noite. Cada um seguia para o seu lado...
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